Na Câmara Municipal, Tribuna Popular emociona ao dar voz às vítimas da hanseníase
Atendendo a requerimento do vereador João Paulo Silva (Podemos), a Câmara Municipal de Rio Branco realizou na terça-feira, 17, uma Tribuna Popular, no qual teve como tema a Conscientização e Divulgação sobre a Semana Municipal de Combate à Hanseníase.
Na ocasião, o autor do requerimento destacou o papel da Câmara no enfrentamento às injustiças históricas ainda não reparadas pelo Estado. “É muito fácil hoje estarmos em cadeiras confortáveis ouvindo esses relatos. Difícil é ter vivido o que eles viveram. A hanseníase não é apenas uma doença — ela destruiu lares, infâncias, sonhos. E muitos dos que precisam da pensão vitalícia ainda aguardam resposta em Brasília. Não se pode morrer esperando por um direito garantido em lei”, afirmou João Paulo.
O parlamentar anunciou a apresentação de um requerimento solicitando à Ministra dos Direitos Humanos, Macaé Evaristo, celeridade nos mais de oito mil processos parados que tratam da pensão especial prevista na Lei nº 11.520/2007.
A tribuna foi utilizada também por representantes do Movimento de Reintegração das Pessoas Atingidas pela Hanseníase (Mohan) e familiares diretamente afetados pela segregação imposta até os anos 1980. O depoimento de Marilsa de Aziz Macedo comoveu o plenário.
“Eu tinha seis meses quando tiraram meu pai de mim. Ele passou 34 anos internado em Souza Araújo. Minha mãe ficou sozinha, no seringal, com duas crianças pequenas. Eu cresci limpando muro enquanto via outras crianças indo pra escola. Roubaram meus sonhos.”
O senhor João Pereira do Nascimento também relatou sua trajetória marcada pela dor e pelo preconceito. “Fui separado da minha mãe e isolado na mata. Me chamavam de leproso e jogavam pedras em mim. Eu tinha saudade da minha mãe, mas não podia subir a escada da casa dela. Hoje estou aqui, com as marcas da doença, mas de cabeça erguida.”
O diretor nacional do Mohan, Elenilson Silva de Souza, reforçou a importância da mobilização. “O que pedimos não é caridade. É justiça. São filhos que foram arrancados dos braços dos pais. O Brasil precisa reconhecer esse passado e reparar as vidas que ele destruiu.”
Já o coordenador estadual do movimento, Elson Dias da Silva, lembrou que o sofrimento continua atual. “Hoje, ainda temos casos de hanseníase em crianças menores de 15 anos. Isso mostra que a luta continua. Precisamos descentralizar o atendimento, capacitar os profissionais e dar dignidade ao tratamento.”
A diretora de Vigilância em Saúde de Rio Branco, Socorro Martins, anunciou que cinco Unidades Básicas de Saúde serão referência no atendimento a pacientes com hanseníase. “Vamos realizar ações nos bairros, com foco no diagnóstico precoce e na interrupção da cadeia de transmissão. A descentralização é um passo urgente e necessário”, afirmou.
O presidente da Câmara Municipal de Rio Branco, vereador Joabe Lira (UB), destacou a importância da escuta ativa e da ação legislativa em pautas que envolvem direitos humanos. “Ficamos profundamente emocionados com os relatos. A Câmara está comprometida em fortalecer ações que ampliem a reparação e a visibilidade dessas pessoas. As falas de hoje não serão esquecidas. São um chamado à nossa responsabilidade.”
O que disseram os vereadores:
Diversos parlamentares utilizaram a palavra para se solidarizar com os convidados e reforçar o compromisso com a luta das pessoas atingidas pela hanseníase. Confira alguns destaques:
Vereadora Elzinha Mendonça se emocionou com os relatos e afirmou: “é um choque de realidade. Ninguém aqui pode mudar o passado de vocês, mas podemos e devemos lutar para que essa injustiça não continue no presente.”
Vereador André Kamai destacou a importância de manter viva a memória de militantes como Bacurau e propôs a valorização histórica do movimento. “O Mohan é um movimento que mudou o mundo. O Bacurau já deveria estar no livro dos heróis da paz.”
Vereador Leoncio Castro compartilhou uma lembrança pessoal sobre a avó que enfrentou a hanseníase, e ressaltou: “vi o preconceito de perto. Vocês sobreviveram, e isso é motivo de orgulho.”
Vereador Aiache reforçou a importância da descentralização do atendimento. “O Estado não pode continuar centralizando algo tão sensível. Estamos ao lado de vocês para ampliar essa rede de apoio.”